O AMOR FECUNDANTE DE ANTÃO E GUILHERMINA [i]
ℛenivaldo
ℛufino
Apareceu certo dia lá pelas bandas de
São Miguel, atual Ringideira, que fica a cinco quilômetros de Monteiro, PB, um belo
e elegante jovem sobre vistoso animal. As moças da vizinhança ficaram agitadas com a visão do fogoso cavalo
transportando aquele espécime de animal racional. Uma das jovens era
Guilhermina, moça faceira e cheia de graça. No esplendor da juventude, ainda
não fora tocada e nem abrasada por um grande amor. Por isso, seus olhinhos
vivos e esfuziantes como que faiscavam, sem sossego, em busca da arrebatadora
paixão. A luminosidade daquele olhar pairava aqui pairava ali, mas não
encontrava dentre os rapazes da região nenhum que a despertasse da letargia
interior.
Quando Antão apareceu, os olhos de Guilhermina continuavam
incansáveis à procura de alguma visão que os encantasse e que fosse gravada com
fogo em sua memória. Eis que seu
olhar se cruza com o abrasador olhar do estranho visitante. Ele esqueceu tudo naquele
momento, até mesmo que era casado. Uma única coisa ocupava sua mente a partir
dali: aquele olhar, aquela pele clara e aquele jeito encantador. E se extasiava
ainda mais com o fato de que seus olhares se cruzaram num aceno recíproco de
cumplicidade.
Naquela noite, nem Antão nem Guilhermina conseguiram tirar a
imagem um do outro da retina e do espírito. Era como uma marca feita a fogo. Uma imagem espiritual que se transformava
aos poucos em uma realidade puramente sensitiva: era como se os olhares ainda
estivessem trocando faíscas. Ela o vê, afoito, altaneiro, esbanjando juventude
e charme na bela montaria. E lembra do detalhe do esbelto corpo do rapaz ao
apear ali tão perto, ao alcance não só do seu olhar, como até mesmo de suas
mãos. Bastavam alguns metros, apenas alguns passos, e poderia até chegar a
tocá-lo. Ainda estremece ao lembrar daquela troca de olhares. E nem se apercebe
que naquele momento, embalada feito uma criança no silêncio e nas trevas do seu
aposento, o coração parece explodir de tanta emoção ao alimentar a doce
lembrança. Uma lembrança que se lembra dos detalhes mais insignificantes,
pueris: o inquieto animal, ao dar volteios em obediência aos comandos do
cavaleiro, parecia interpretar o ansioso movimento dos seus corações; os raios
intensos do sol eram menos ardentes que as ardentes chamas que queimavam o seu
íntimo, e que nem eram chamas; o leve sorriso nos lábios do jovem inundava seus
olhos de tamanha felicidade, que estes é que pareciam sorrir; era impossível
qualquer um dos dois esconder a alegria do encontro, da descoberta, do encanto
e da beleza daquele momento.
Agitada por tantas emoções, Guilhermina ficou acordada, sem
perceber, com o pensamento na luz daquele olhar. Seu corpo era impulsionado em movimentos sobre o
leito, estremecendo como sob o efeito de uma carga elétrica. De repente, lembra
que nem sabe seu nome. “Que importa não saber seu nome”, reflete, “uma vez que
o importante é, de fato, aquilo que o nome nomeia. O nome é apenas um signo. O
que importa é o seu significado”. E aquilo que o desconhecido nome nomeava
estava, de fato, ali com ela, muito bem guardado no relicário secreto do
coração. Era tão seu, que apenas ela tinha acesso ou alguém a quem quisesse
abrir as portas do seu íntimo. Ou, então, conforme diz Harari à página 73 de
suas “21 lições para o século 21”, “...nenhum sistema externo pode compreender
meus sentimentos melhor do que eu”. Guilhermina se vira na cama e continua se
deixando embalar pelo doce pensamento: “Não, não é preciso saber seu nome”,
pondera em meio aos movimentos e ao silêncio das trevas que a rodeiam, “não,
não é necessário saber, pois aquilo que o nome nomeia já tenho aqui dentro de
mim mesma, como tenho centenas de outras coisas”. E se deixou levar,
maravilhada, pela ideia que a tomava naquela hora, pois dentro de si trazia
tantas e tantas coisas, inclusive aquela nova e maravilhosa coisa que a deixara encantada, como a
encantava também a própria natureza e tanta beleza que a cercava naquele
pequeno e aconchegante lugar onde morava desde que nascera. Tinha tudo guardado
dentro de si: o sol, a lua, as estrelas, as árvores, as pessoas queridas, a
imensidão do céu azul, as belas formações rochosas da região e, agora, a forma
mais bela que todas as formas, o cavaleiro do qual ela não sabe sequer o nome. Todas
essas coisas estavam dentro dela, mas apenas em imagens gravadas pelos sentidos
e depositadas no seu espírito.
Ele, não muito longe
dali, estava igualmente perturbado. Ficou como que em êxtase com a imagem de
Guilhermina que teve diante de si. Acomodou-se na cama. O quarto estava
inundado de silêncio e trevas, pois ele dera um sopro e apagara o pavio do
candeeiro. As doces lembranças vieram a sua mente. Só então conseguiu cair na
real e pensar em outras coisas. Pensou, por exemplo, no seu estado civil, que
naquele momento parecia perturbar a serenidade do grande afeto que começara a
nascer e aquecer seu coração. Jamais sentira aquele tipo de abalo. A paixão
fora repentina. Consciente da seriedade daquele momento, ele se pergunta: “O
que fazer numa situação dessas? Será que estou cego?” Como sabemos, paixão e
cegueira andam de mãos dadas. E era paixão mesmo o que estava sentindo? Era uma
mistura de paixão e amor. Será que deveria calar o calor do amor e dos potentes
laços de Eros? Será que deveria ceder impotente ao temor baseado em convenções
humanas, em normas sociais e religiosas de falso moralismo? Sem conseguir dormir,
levantou-se e saiu caminhando pelo quarto escuro, como que arrebatado pelo
despertar de um incontido amor. Quando retornou à cama, sentiu-se como que
tomado e envolvido, no mais íntimo do ser, pelos doces afagos daquela de quem
nem sequer sabia o nome. Mas isso não representava problema algum, pois ela
também não sabia seu nome. Estava certo, porém, de pelo menos uma coisa: a
pessoa é mais importante do que o nome que a nomeia, nome que nem é e jamais
será a própria pessoa. E este é o último pensamento que embala a ambos,
antes de caírem em profundo sono.
Os dias seguintes são importantes para ela e para ele. Antão retorna ao local onde vira
Guilhermina, agora atraído pelo forte ímã daquele encanto de moça. No tempo
certo se aproximam um do outro e se conhecem pelo nome. Nomes que escondiam significados
guardados em seus corações. Bastava pronunciar o nome e o agradável som
entra-lhes pelos ouvidos e forma uma bela imagem no espírito. Agora, estava
completo: ao significado juntou-se o signo, isto é, o nome, e ambos eram
embalados pelo amor que foi crescendo à medida que os dias passavam. A troca de
olhares passou a ser constante e penetrante: era como se cada um quisesse
entrar na alma do outro, para descobrir encantos e belezas indizíveis. Chegaram
aos toques, carícias, beijos e muito mais.
É nessa ambiência erótica e edênica, que Antão engravida Guilhermina, que se torna mãe solteira. As ondas dos costumes, convenções morais, sociais e religiosas, caem em cima do casal com ódio incontido. Mas o amor dos dois os amparou, tudo suplantou e lhes deu a vitória. Daquela bela união carnal e do amor fecundante de Antão e Guilhermina, nasceu Guilhermina Maria da Conceição.
Na filha, o nome tanto da própria mãe, para dar continuidade a tudo de positivo que ali existira, como também o nome daquela que fora igualmente mãe solteira e de cuja semente brotara o cristianismo. Maria, mãe de Jesus, enfrentou ondas ainda maiores, e se livrou do apedrejamento graças à corajosa e humilde atitude de José. Ela mesma tirou da marginalidade aquelas que são marginalizadas até hoje pelas convenções sociais do falso moralismo. O cristianismo, que se originou de uma mãe solteira, validou a geração que surgiu das entranhas de Guilhermina, já valorizada como mulher pela grandiosidade e beleza da própria natureza. Vidas que geram vidas pela dinâmica de Eros, Antão e Guilhermina dão vida, e vida em abundância, à ardente chama do amor que surgiu entre ambos e que se propagou em preciosas vidas pelos séculos a fora. Por isso, sinto-me orgulhoso ao escrever esta pequena crônica quase em formato de conto, a partir de minha raiz genealógica, eu que também sou fruto do amor fecundante, quer dizer, do amor existente entre Antão e Guilhermina, e também do amor existente em toda sua posteridade.
[i] No encontro que tive em 2008 com meu primo Marçal Rufino, em São Paulo, ele me contou apenas que nosso bisavô materno, Antão, era casado quando namorou Guilhermina e a engravidou. A partir desse detalhe, resolvi romancear o encontro dos dois e procurei dar uma pincelada filosófica até nas fantasias de seus pensamentos.
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ANTÃO E GUILHERMINA já chegaram à casa de PENTAVÓS, ou seja, à metade da relação:
Pais: 2 – Filha/Filho
Avós: 4 – Neta/Neto
Bisavós: 8 – Bisneta/Bisneto
Trisavós: 16 – Trineta/Trineto
Tetravós: 32 – Tetraneta/Tetraneto
Pentavós: 64 – Pentaneta/Pentaneto
Hexavós: 128 – Hexaneta/Hexaneto
Heptavós: 256 – Heptaneta/Heptaneto
Octavós: 512 – Octaneta/Octoneto
Eneavós: 1024 – Eneaneta/Eneaneto
Decavós: 2048 – Decaneta/Decaneto
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A seguir, demonstrativo parcial das fichas genealógicas a partir de ANTÃO E GUILHERMINA, sendo que algumas delas ainda incompletas e onde constam apenas:
1) Filha de Antâo e Guilhermina: Guilhermina Maria da Conceição.
2) Netas e netos de Antão e Guilhermina e, portanto, filhas e filhos de Guilhermina Maria da Conceição.
3) Bisnetas e bisnetos de Antão e Guilhermina e, portanto, netas e netos de Guilhermina Maria da Conceição.
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FICHA GENEALÓGICA DE ANTÃO E GUILHERMINA:
Antão e Guilhermina geraram: Guilhermina Maria da Conceição, filhas e filhos.
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E nada mais sabemos sobre esses nossos ancestrais: nem seus nomes completos, nem datas de nascimento e morte, e nem nomes e demais dados de filhas e filhos do casal, além de Guilhermina.
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Ficha Genealógica incompleta de GUILHERMINA MARIA DA CONCEIÇÃO e RUFINO JOSÉ DOS SANTOS:
Guilhermina Maria da Conceição ou de Jesus (___.___.___-___.___.1945) e Rufino José dos Santos (___.___.___-___.___.1934) geraram:
1. Antônio Rufino dos
Santos (___.___.1897-15.05.1975 [78])
2. Josefa Rufino dos
Santos (?)
3. Francisco Rufino dos
Santos (nasceu em 1900? Morreu aos 24 anos, em 1924?)
4. Ana Rufino dos Santos
(____.05.1903-21.06.1952 [49])
5. Guilhermina Rufino dos
Santos (3ª Guilhermina, casada com “tio” Néco)
6. Nicoláu Rufino dos
Santos (06.12.1906-04.02.1966 [59])
7. Bertila Rufino dos
Santos (1908? morreu aos 2 anos, quando tio Jorge nasceu)
8. Jorge Rufino dos
Santos (23.04.1910-02.11.2010 [100 a, 6 m e 10 d])
9. Anísia Maria Rufino
dos Santos (16.02.1914-20.10.1980 [66])
10. Maria Rufino dos
Santos (morreu aos 12 anos)
11. Apolinária Rufino dos
Santos (“Didi”) (___.______._______-10.01.1970)
12. Maria Rufino dos
Santos (07.04.1919-16.04.1978 [59])
13. Antônia Rufino dos
Santos (____.____.____-01.1952)
14. Genésia Rufino dos
Santos (12.03.1923-08.01.1967 [43])
15. Ambrósia Rufino dos
Santos (______.______.1920-____.____.______)
16. Inês Rufino dos
Santos (morreu aos 16 anos)
17. Crispiniano Rufino
dos Santos (?)
18. José Rufino dos
Santos (____.____.____-____.____29.12.2015)
19. Sebastião Rufino dos Santos (?)
20. ?
Tio Jorge não lembrou o
nome do vigésimo irmão, e seria demais cobrar isso dele, aos 97 anos!
Foram 22 filhos, segundo
minha irmã informou às 12h27, de 29.03.2020.
Entre colchetes [ ] a idade que a pessoa tinha quando morreu.
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Ficha incompleta de ANTÔNIO E SILVINA:
Antônio Rufino dos Santos (___.___.1897 -15.05.1975 [78]) e Silvina Ferreira Rufino (___.___.___- 26.11.1956) geraram:
1. Agripino Rufino dos
Santos (06.06.1917-09.12.1999 [82])
2. Eliseu Rufino dos
Santos (?)
3. Nemésio Rufino dos
Santos (?)
4. José Rufino dos Santos
(?)
5. Filomena Rufino dos
Santos (?)
6. Josefa Rufino dos
Santos (?)
7. Apolinária Rufino dos
Santos (?)
8. Otávia Rufino dos
Santos (?)
9. Lídia Rufino dos
Santos (?)
10. Inês Rufino dos
Santos (?)
2. Raimundo Rufino Freire (21.05.1938)
3. Geraldo Rufino Freire (06.07.1941)
4. Sebastião Reginaldo Rufino Freire (03.03.1943)
5. José Renivaldo Rufino (29.03.1946)
6. Luzia Maria Freire (14.11.1948)
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Ficha completa de ANÍSIA E JOÃO:
Anísia Maria Rufino Nunes (16.05.1914-01.10.1980 [66]) e
João Tarcísio Nunes (14.12.1914-23.11.1991 [77]) geraram:
1. José Tarciso Nunes (11.11.1936-12.07.2009 [72])
2. Vicente Tarciso Nunes (09.12.1937-13.09.1971 [33])
3. Maria de Lourdes Tarciso Nunes (28.11.1939)
4. Antônio Tarciso Nunes (30.10.1940-24.07.1986 [45])
5. João Bosco Nunes (09.01.1946-2019-16.03.2019 [73])
6. Maria Aparecida Nunes (26.06.1947)
7. João Batista Nunes (24.06.1949)
8. Teófilo Tarciso Nunes (05.03.1951)
9. Margarida Ivone Tarciso Nunes (21.06.1952)
10. Carlos Ridelson Tarciso Nunes (21.06.1955-22.05.2017 [61])
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Ficha completa de JORGE E MARIA:
Jorge Rufino dos Santos (23.04.1910-02.11.2010 [100a, 6m e 10d]) e
Maria Ferreira dos Santos (02.04.15-26.12.1994 [79]) geraram:
1. Maria do Carmo Ferreira dos Santos (28.02.1938–28.03.1938 [28 dias])
2. José Ferreira dos Santos (20.02.1939 – viveu apenas 1 mês)
3. Sebastiana Ferreira dos Santos (19.09.1941-18.04.2001 [60])
4. Maria Carmelita Ferreira dos Santos (14.03.1945-09.10.2012 [67])
5. Francisco Ferreira dos Santos (20.04.1947-12.12.2015 [68])
6. Ezequiel Ferreira dos Santos (03.01.1950-20.03.1982 [32])
7. Vicente Ferreira dos Santos (06.09.1951-24.09.2000 [49])
8. José das Chagas Ferreira dos Santos (17.12.1954-23.01.1955 [1m.,6d.])
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Ficha incompleta de MARIA E PEDRO, e MARIA E ADÃO:
Maria Rufino Branquinho (07.04.1919-16.04.1978 [59]) e
Pedro Bezerra Branquinho (___.___.___-16.01.1945) geraram:
1. Maria do Socorro Branquinho (08.12.1938-31.07.2011 [72])
2. Heleno Duarte Branquinho (13.11.1939-____.____.____ [])
3. Maria Estelita Branquinho (02.04.1941)
Maria Rufino Branquinho (07.04.1919-16.04.1978 [59]) e
Adão de Siqueira Paiva (30.10.1902-18.07.1976 [73]) geraram:
4. Jacob de Siqueira Paiva (28.11.1946)
5. Antenor de Siqueira Paiva (12.02.1956)
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Ficha completa de GENÉSIA E LAURINDO (SENHORZINHO):
Genésia Liberal dos Santos (12.03.1923-08.01.1967 [43]) e
Laurindo Tarcísio Liberal (20.01.1910-17.08.1994 [84]) geraram:
1. José Tarcísio Neto (02.06.1940-23.07.2011 [71])
2. Paulo Liberal dos Santos (25.01.1949)
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GALERIA PARCIAL DE FOTOS DA HERANÇA GENÉTICA DE ANTÃO E GUILHERMINA
OBSERVAÇÃO
Em cima da foto, a identificação da raiz da genealogia a partir de Guilhermina e Rufino
JORGE/MARIA, NICOLÁU/MARIA, ANTÔNIO/SILVINA